Quando o assunto é a preferência pelo clima frio há quem torça para os dias quentes durarem um pouco mais, em contrapartida há os que adoram ver os termômetros despencando junto com as temperaturas. Quando o clima esfria de vez, cada um aproveita à sua maneira a temporada de inverno e pelo menos em uma coisa todos concordam: como é bom buscar refúgio na variedade gastronômica que esquenta e alimenta! São muitas as opções, como doces, chocolate quente e comidas salgadas, como as sopas e os caldos, muitas vezes com certo exagero no sal. “O consumo diário de sal recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de até cinco gramas (o que equivale a dois gramas de sódio). No Brasil, o consumo é de quase o dobro do recomendado, e durante o inverno esta quantidade pode ser ainda maior, o que pode ser prejudicial e favorecer o aparecimento das famosas pedras nos rins, também conhecido por cálculos renais, principalmente caso este aumento do consumo de sal venha acompanhado da diminuição da ingestão de água”, explica o médico urologista, Dr. Lucas Burttet, de Porto Alegre, RS.
Um estudo britânico divulgado recentemente no site Renal and Urology News fez uma descoberta importante, sugerindo que tomar mais água e modificar a dieta para o consumo de alimentos mais saudáveis podem evitar o desenvolvimento de pedras nos rins: “Em um estudo recente com mais de 400 mil participantes que usaram o UK Biobank – um banco de dados biológicos do Reino Unido – os pesquisadores descobriram que cada ingestão adicional de 200 mL de líquido total por dia estava associada a uma significativa redução do risco de 13% de pedras nos rins, e que cada aumento de 50g no consumo de carne por semana foi associado a um aumento de 17% no risco de desenvolvimento de cálculos, o que levou os autores da Universidade de Oxford a comprovarem que a dieta é fator modificável importante para a prevenção de pedra nos rins, conforme relataram na revista científica European Urology Focus”, pontua Dr. Lucas Burttet, urologista.
Os cálculos urinários são uma massa dura que pode se formar nos rins, ureteres (canal que liga o rim à bexiga) ou bexiga e se desenvolvem a partir de cristais que são encontrados na urina. “Os cálculos renais e ureterais são muitas vezes eliminados com a urina sem causarem qualquer desconforto, mas podem causar dor intensa e outros sintomas associados como náuseas ou febre, quando há infecção concomitante. As pedras causam sintomas geralmente quando ficam presas no ureter ou quando são muito grandes para sair do rim e bloqueiam o fluxo normal da urina. Nestes casos pode haver necessidade de procedimentos cirúrgicos para remoção dos cálculos”, alerta Dr. Lucas Burttet.
O paciente L.A.V. entende bem deste problema. Aos 39 anos, sofre com cálculos renais desde os 17 anos de idade e, apesar de ter casos na família, conta (com ‘uma pausa para um gole de remorso’, como ele mesmo fala) que tomava pouca água e que, infelizmente, ainda continua com o mau hábito: “Não consegui mudar meus hábitos, mas aconselho às pessoas que passam por este problema que tomem muito líquido, procurem um bom médico e sigam o que o médico falar.” Antes, ele expelia a pedra, até que não conseguiu mais e passar por uma crise muito séria, onde foi realizada uma cirurgia a laser. A recuperação foi tranquila, “com um certo incômodo por causa do cateter interno”, que fica por uns 30 dias até novo procedimento para a sua retirada.
Não é de hoje que os cálculos renais causam sofrimento às pessoas, mas atualmente a probabilidade de mais pessoas desenvolverem o problema aumenta na proporção que aumenta o desequilíbrio na alimentação e no estilo de vida das pessoas.
Dados da Associação Europeia de Urologia apontam que 12% da população mundial algum dia apresentará um episódio de cálculo, e entre essas pessoas a proporção é de quatro homens para cada mulher afetada, predominando na terceira e quarta décadas de vida. “A ingestão excessiva de alguns alimentos pode provocar ou acelerar distúrbios pré-existentes no organismo propiciando o desequilíbrio químico necessário para a formação destes cálculos”, explica o urologista.
Os alimentos:
• Cálcio: a ingestão só deve ser controlada ou reduzida em casos confirmados de pacientes com alta sensibilidade à ingestão de leite e derivados, na maioria dos pacientes, o cálcio presente na alimentação não aumenta o risco de formação de cálculos;
• Sódio: sal de cozinha deve ser restringido para aproximadamente 1 colher de chá por dia;
• Proteínas: principalmente as de origem animal (carnes, peixes, aves, ovos, leite e derivados) apresentam um efeito agravante quanto à formação dos cálculos;
• Ingestão de Líquidos: o aumento da ingestão de líquidos é provavelmente a orientação mais importante que deve ser dada para estes pacientes, pois somente esta medida sem a ação de medicamentos pode reduzir em 60% a incidência destes cálculos.
Causas:
Acredita-se que vários fatores possam estar envolvidos na formação dos cálculos renais, como:
• A super saturação urinária – situação em que há excesso de elementos que compõem a urina;
• A diminuição dos inibidores urinários – substâncias existentes cuja função é impedir a cristalização de urinas super saturadas, substâncias protéicas que servem como núcleo para a formação do cálculo sobre o qual se depositam cristais;
• A retenção de cristais no trato urinário, além de fatores genéticos que também podem contribuir para o aumento da formação de cálculos.
• Pode ocorrer ainda por aumento da próstata, obstruindo parcialmente a saída de urina, o que causa o acúmulo de cristais e outros resíduos, que com o passar do tempo se transformam em cálculo.
• Processos obstrutivos como a estenose da junção uretero-pélvica (obstrução ao fluxo de urina na saída do rim) que podem gerar acúmulo de urina facilitando a aglomeração de substâncias que formam os cálculos.
Tratamento:
Os cálculos formados no rim podem ter três caminhos: Aumento de tamanho; Eliminação e estabilização. Na maioria dos casos há indicação de realização de exames para identificar a causa da formação dos cálculos e, quando identificadas, tratamentos específicos como dieta ou medicamentos podem ser iniciados. As abordagens cirúrgicas vão depender da localização, tamanho e tipo do cálculo.
1 – Litotripsia extracorpórea por ondas de choque – Nesse procedimento, não há cortes ou incisões. O paciente recebe ondas de choque que se difundem pelo corpo e concentram sobre o cálculo, fragmentando-o. Geralmente indicado para cálculos entre 5mm e 2 cm.
2 – Cirurgia percutânea – Nessa cirurgia são realizadas pequenas perfurações na região lombar para acessar o cálculo no interior dos rins. Por meio desses pequenos orifícios, utiliza-se uma câmera para realizar a fragmentação e remoção da pedra.
3 – Ureterolitotripsia endoscópica – Nesse procedimento utilizamos um aparelho endoscópico, com uma câmera que permite visualizar o interior da bexiga, ureteres até os rins. Esse aparelho é introduzido pelo canal da urina (uretra). Assim, não há necessidade de cortes ou incisões. Por meio desse aparelho remove-se os cálculos do interior do ureter geralmente após a fragmentação dos cálculos com laser.
4 – Cirurgia convencional – Em raros casos há necessidade de realizar cirurgia tradicional com incisão da parede abdominal para remoção dos cálculos diretamente pelo cirurgião.
5 – Cirurgia laparoscópica ou robótica – Também é pouco frequente, mas em algumas situações pode se utilizar cirurgia laparoscópica (por vídeo através do abdômen) com ou sem assistência da robótica, para retirada de cálculos.
Dicas:
• Beba de 2 a 3 litros de água por dia e evite ingestão em excesso de proteína animal, principalmente a da carne vermelha;
• Leia o rótulo dos alimentos para verificar a quantidade de sódio. Os fabricantes são obrigados a informar, no rótulo do produto industrializado, o teor de sódio no alimento. Alguns alimentos processados concentram tanto sódio que uma única porção tem quantidade superior à recomendada para ingestão diária;
• Tire o saleiro da mesa. É recomendável salgar os alimentos na panela, durante o preparo, para ter controle da quantidade usada;
• Substitua o sal por condimentos e ervas. Há uma série de alimentos naturais que acentuam os sabores dos alimentos e podem substituir o sal, como salsinha, alecrim, orégano, pimenta-do-reino, louro, hortelã, páprica e outros.